O Skateboarding, para os skatistas, sempre foi sinônimo de diversão. Desde sua criação, seus praticantes o veem como um ato de liberdade, uma forma de se expressar. Uma grande prova disso é o primeiro filme de skate lançado em 1965 e intitulado “Skaterdater”, uma exaltação à juventude, a fuga à realidade e um verdadeiro grito de liberdade.
Durante toda a história do skate a cidade sempre foi vista como um enorme obstáculo convidativo para desenvolver suas habilidades e estilo. O skate é naturalmente urbano e interage com a arquitetura, os edifícios, os objetos urbanos, as paisagens e os espaços.
Há anos skatistas e a sociedade coexistem em harmonia – na maioria das vezes. Em busca de desafiar seus próprios limites, vez ou outra a convivência amigável se transforma em confronto. Não podemos ser ingênuos a ponto de dizer que sempre houve uma relação pacífica com todas as partes envolvidas no contexto urbano.
THE WASHINGTON POST: “SKATE É UMA ATIVIDADE DESTRUTIVA”
Em vários momentos da história o skatista foi retratado como rebelde e criminoso, um destruidor de propriedade privada. Nas décadas de 1980 e 1990, não era fácil andar de skate pela cidade. Nos EUA, praticantes enfrentaram toques de recolher, legislação proibitiva e banimentos de áreas públicas em San Francisco, San Diego e Santa Cruz, o lar espiritual do esporte. Logo a proibição expandiu para Nova York, Chicago, Denver, Portland e outras grandes áreas metropolitanas.
Na época, o jornal The Washington Post até declarou o skate como uma “atividade destrutiva” que deveria ser proibida em espaços públicos como ruas, estacionamentos, calçadas e parques. Logo, Estados Unidos e Europa multavam e confiscavam skates, então a Polícia e os seguranças particulares rapidamente se tornaram os piores pesadelos dos skatistas.
A legislação anti-skate se espalhou pelo mundo e países como Austrália, Brasil, Canadá, México, Holanda, Nova Zelândia e Suécia começaram a repreender a atividade. O Brasil também não ficou de fora. Prisões e apreensões foram feitas e os skatistas – mais do que nunca – eram vistos como invasores e criadores de problemas que deviam ser presos.
“GRAÇAS A DEUS ELES NÃO TÊM ARMAS” – GEORGE BUSH
Com o aumento da vigilância privada, foram criados diversos obstáculos afim de impedir skatistas de aproveitar a geografia urbana, como divisórias de ferro, superfícies com textura áspera, espigões de peitoril de janela, blocos obstrutivos e correntes restritivas.
Skatestopper, um mecanismo anti-skate criado por Chris Loarie, foi adicionado a corrimãos e outras superfícies de rua para impedir o skate em vários locais. Loarie inevitavelmente se tornou o pior inimigo e uma das pessoas mais odiadas na comunidade do skate. Até 2015, havia mais de um milhão de dispositivos anti-skate instalados em mais de 10.000 locais.
“Graças a Deus eles não têm armas”, afirmou certa vez o ex-presidente dos Estados Unidos, George Bush.
Em 2011, o skate ainda era considerado um “problema da juventude desordeira” pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos.
Com tanta repressão, a modalidade inevitavelmente perdia praticantes, mas seus dissidentes mais rebeldes ainda insistiam e protestavam, chamando atenção da mídia e pedindo o mínimo: acesso aos espaços públicos e mais locais próprios para a prática do skate.
Em 2015, um motorista de táxi matou um longboarder no centro de Toronto, no Canadá. Dois anos depois, outro caso, quando um motorista atropelou cinco praticantes no centro de São Paulo.
DOMÍNIO PÚBLICO: SKATE NÃO É CRIME!
O curioso é pensar que a expressão “Skateboarding Is Not a Crime” é mais antiga do que leis anti-skate e todos os obstáculos criados para impedir a prática.
O poderoso lema apareceu no vídeo de 1988 de Powell-Peralta intitulado “Public Domain”.
Um clipe que apresentava adesivos colados por toda a parte da cidade e nos shapes de skate.
O famoso slogan foi até estampado em camisetas e outros souvenires e impulsionou um movimento internacional que contestou as proibições, repressões e restrições ao skate por todo o mundo.
SKATEBOARDING IS NOT A CRIME: MANIFESTO UNIVERSAL
Em 5 de maio de 1997, a NHS, Inc., da marca de skate Santa Cruz, fundada por Richard Novak, Doug Haut e Jay Shuirman, registrou o manifesto pró-skate. Mesmo na época, parece que eles sabiam o quão poderosa, justa e atemporal, além de altamente comercial e envolvente, essa frase era.
Com a chegada dos anos 2000, a virada de década lançou uma nova luz sob a modalidade e lentamente a mentalidade das autoridades amadureceu e, enfim, começou-se a perceber lentamente que o skatista só queria uma única coisa: andar de skate.
A atividade, antes tida como rebelde e cercada de estereótipos, aos poucos não era mais má vista pela sociedade. A exemplo do surf, seu “irmão mais velho”, foi ganhando reconhecimento e se profissionalizou. Agora, os skatistas não são mais considerados criminosos de rua, mas vistos como verdadeiros atletas. É inegável que o crescimento meteórico das Skateparks também colaborou para melhorar a relação entre os praticantes, a polícia e a sociedade.
O skate também ganhou um dia de celebração. No dia 21 de Junho é comemorado no mundo todo o Go Skateboarding Day, afim de promover o skate e atrela-lo a um estilo de vida saudável ao ar livre.
A mentalidade de toda a sociedade continuou evoluindo e hoje a modalidade é ainda mais plural e inclusiva, tendo adeptos de todas as idades e estilos. Em 2021, ela finalmente estreará nas Olimpíadas, uma aposta dos organizadores dos jogos para atrair e renovar o público do evento.
Pode-se dizer, enfim, que todo aquele injusto histórico imputado por anos aos skatistas vai virando coisa de um passado não tão distante, relembrado agora apenas como uma lembrança desagradável na belíssima história da evolução do skate e toda a revolução que ele inspirou no passar dos anos. Viva o skate, viva a liberdade.
Deixe uma Resposta
Você deve ser registrado em postar um comentário.